Riferimenti bibliografici
Correram 25 anos de nossos primeiro encontro, em Porto Alegre, com Dr. Marcello Pacini, Diretor Cultural da Fondazione Giovanni Agnelli. Estávamos a cinco anos da comemoração do Centenário da Imigração Italiana no Rio Grande do Sul, celebrado em 1975. Havíamos publicado algumas obras sobre o tema, de nossa autoria e de outros autores, sem qualquer pretensão, com o único intuito de celebrar a data e homenagear os precursores da centenária Imigração Italiana e sesquicentenária Imigração Alemã no Rio Grande do Sul.
Eis que nos chega de Torino uma visita inesperada e desconhecida. Era o Dr. Marcello Pacini, dizendo que nos escolhera, por informação de amigos, para realizarmos uma pesquisa sobre a Imigração Italiana no Brasil. A estranheza foi maior quando nos disse que devíamos formar uma equipe de pesquisadores.
Desde 1975, havíamos registrado entrevistas com vistas à publicação da obra Imigração Italiana no Rio Grande do Sul: vida costumes e tradições, obra que mereceu menção honrosa da Comissão do Biênio da Imigração e Colonização no Rio Grande do Sul. Entrevistas aproveitadas em parte na obra.
Diante do pedido de Pacini, nossa resposta foi de que nós poderíamos colaborar, mas não assumir tamanha responsabilidade, a que Pacini nos respondeu:
«Meu desejo é que em cada parte do mundo de significativa imigração italiana, pessoas do respectivo grupo escrevam a própria história, da maneira como julgarem, na ótica que acharem importante para o grupo. Não importa a maneira de pensar e de fazer.»
Diante desta proposta, nossa resposta foi: «Nosso sonho é entrevistar anciãos, sem nada propor, mas apenas para ouvi-los contar como foi a vida nos inícios da imigração, como fora a vida na Itália, por que vieram para o Brasil, como iniciaram e desenvolveram a sua experiência existencial e cultural italiana no Brasil. Entrevistas na linha da percepção, da memória, da saudade, da luta, da fé e do trabalho, seguindo como roteiro mental os catorze sistemas de análise social, os sistemas parentesco, sanitário, manutenção, lealdade, lazer, viário, pedagógico, patrimonial, produção, religioso, segurança, político, jurídico e precedência.
Com inúmeras entrevistas já feitas, encontramos uma saída para atender à solicitação de Pacini, que foi a de lhe oferecer nossas pesquisas para que ele as usasse conforme julgasse oportuno, porque nosso objetivo era salvar a palavra, a linguagem, a foto de imigrantes e descendentes especialmente de primeira geração.
A surpresa nos levou à coerência do compromisso, quando Pacini nos responde: «Vocês façam o que quiserem e como quiserem, que os apoiarei, com o único compromisso de formarem uma equipe de pesquisadores da vida e cultura italiana no Rio Grande do Sul e do Brasil.
Recorremos ao arquiteto Júlio Posenato para realizar a primeira fase do empreendimento, da qual resultou a publicação da obra Assim vivem os italianos, os três primeiros volumes, em 1982 e 1983, com 1.550 páginas, de autoria de Rovílio Costa e Arlindo Itacir Battistel, e o quarto volume, abordando a arquitetura da Imigração Italiana, em 1983, 660 páginas, de autoria de Júlio Posenato.
Com o retorno da Alemanha, onde fizera doutorado, do Prof. Luis Alberto De Boni, a equipe se ampliou, as publicações aumentaram às dezenas, professor De Boni introduziu o estudo da Imigração Italiana na cadeira de Estudos Brasileiros da Universidade de Caxias do Sul, de que resultou a publicação, em co-autoria Luis A. De Boni e Rovílio Costa, de Os Italianos do Rio Grande do Sul, publicado com apoio da Fondazione Giovanni Agnelli em 1972, atingindo terceira edição em 1984. A obra integra o terceiro volume de Euroamericani,publicado pela Fondazione Giovanni Agnelli, em 1987, com o título La popolazione de origine italiana in Brasile.
Em 1984, Dr. Pacini nos convidou (Costa, Battistel) para uma visita à Itália, oportunidade em que foi lançada na Itália a coleção de Assim vivem os italianos, e, para ver o outro lado do pensar italiano, com apoio da Fondazione Giovanni Agnelli, escolhemos 600 endereços de sobrenomes do Trivêneto e Lombardia, que sabíamos existirem também no Rio Grande do Sul, e elaboramos uma carta que foi enviada a todos, onde se pedia:1. Recorda se alguém de sua família emigrou? Em que época? Para onde? 2. Ouviu falar se alguém de sua família emigrou para o Brasil, ou para Rio Grande do Sul? 3. Gostaria de estabelecer contato epistolar com pessoas do mesmo sobrenome existentes no Rio Grande do Sul.
Estas perguntas tiveram o objetivo de ordenar as memórias dos êxodos de emigrantes da Itália para o Rio Grande do Sul. Mais de 60 per cent das cartas tiveram resposta positiva. Desta pesquisa nasceu a idéia de promover a consciência da identidade histórica de outras Itálias, não peninsulares, existentes em todo o planeta, onde grupos significativos de imigrantes, a partir sobretudo de 1875, se estabeleceram e tiveram condições políticas, econômicas e religiosas de manterem e desenvolverem sua experiência cultural.
Com os dados da pesquisa promovida pela Fondazione Giovanni Agnelli, publicou-se o seriado Itália de nossos avós, pondo em contato a Itália de além-mar com a Itália do Rio Grande do Sul, cuja idéia continua alimentada no seriado Vita, Stòria e Fròtole, com o registro e publicação de três mil histórias de vida.
Durante um ano, com base na pesquisa epistolar, acima citada, percorremos a Itália, usando trem, ônibus, mas em grande parte a pé nos lugarejos de agricultura, para perceber o solo, o clima, a vegetação, a maneira de viver e de trabalhar mais semelhantes e próximas às vividas por nossos antepassados.
Esta experiência também a estruturamos como pesquisa oral, com entrevistas com pessoas de terceira idade de famílias que tiveram imigrantes para o Rio Grande o Sul. Destas entrevistas resultaram duas obras que registram em detalhes o quotidiano italiano e ítalo-brasileiro e gaúcho do período da grande imigração, de 1875-1914. As obras são Polenta e Liberdade, de Arlindo Itacir Battistel, 1998, em forma de uma grande história das duas pátrias, e As Duas Itálias, de Arlindo Itacir Battistel e Rovílio Costa, 2000, contendo as entrevistas transcritas e traduzidas das entrevistas que fundamentam a obra Polenta e Liberdade.
A publicação do seriado Itália de nossos avós, com base na pesquisa epistolar referida evidenciou logo a necessidade de uma profunda pesquisa de fontes genealógicas das famílias italianas aqui emigradas, a começar das colônias imperiais, especificamente Caxias do Sul, Garibaldi e Bento Gonçalves, do que resultaram as obras em co-edição da EST Edições e Fondazione Giovanni Agnelli:Povoadores da Colônia Caxias, de Mário Gardelin e Rovílio Costa,1992; Colônias Italianas Conde d’Eu e Dona Isabel, de Rovílio Costa e outros, 1992; Antônio Prado e sua história, e São Vigílio da Treceira Légua, 1980, ambas de Fidélis Dalcin Barbosa;Costella-Mattiello, uma presença ítalo-brasileira, de Gentil Costella; Registro de imigrantes do Núcleo Colonial de Nova Palmira, aos cuidados de Rovílio Costa, 1989. A estas obras seguiram-se uma dezena de outras obras genealógicas do mesmo grupo de pesquisas, o que desencadeou uma retomada segura das origens da identidade de muitas famílias, intercâmbios culturais com a Itália, a retomada da língua materna, bem como o início do Ensino do Italiano Oficial no Estado, a partir do município de Carlos Barbosa, com apoio da Fondazione Giovanni Agnelli, a partir de 1987.
Em âmbito de Brasil, a Fondazione Giovanni Agnelli nos possibilitou a realização de três grande simpósios, com a publicação de três volumes A presença italiana no Brasil, com média de 600 páginas cada um, publicados em 1987, 1990 e 1996, levando os estudos ítalo-brasileiros para os diferentes estados e Universidades. Todas estas obras são, hoje, referência obrigatória nos estudos imigratórios no país e no exterior.
Os antropólogos dizem que a língua continua sendo o núcleo central da identidade étnica. As palavras levam consigo significados, símbolos, valores, crenças e uma forma própria de expressar a própria auto-imagem e auto-estima. O Rio Grande do Sul, por sua peculiaridade na forma de assentamento de colonos alemães, italianos, poloneses e outros, colocados em áreas geográficas correspondendo a áreas étnicas, viabilizou a manutenção pacífica do idioma, da escola e do culto, em nosso caso, em Italiano. Isto de 1875 até 1937. De 1937 a 1945, pela política do Estado Novo, as expressões lingüísticas estrangeiras são proibidas, passando a ser possível só a fala em língua portuguesa.
De 1945 em diante, voltou-se à liberdade étnico-lingüística, mas o crime estava praticado. As escolas, o culto, os jornais, as publicações em língua estrangeira haviam desaparecido e a língua portuguesa foi tomando conta do território nacional, continuando a proibição, por exemplo, do bilingüísmo nas escolas. Só a atual Constituição Federal de forma genérica reconhece as expressões culturais existentes no país como patrimônio cultural brasileiro, incluindo-se aqui as expressões lingüísticas. Mesmo assim está em estudo um novo ataque político às culturas minoritárias com uma provável lei que venha a proibir todo e qualquer uso em atos públicos de palavras, nomeações de fatos, instituições e acontecimentos em língua estrangeira. Seria uma última e definitiva varredura do multilingüísmo.
No caso do Italiano falado, sob a forma de uma mescla de dialetos italianos especialmente do norte da Itália, com prevalência da fórmula vêneta de falar, formou-se no Rio Grande do Sul uma língua unitária denominada Talian, que segundo alguns é a última língua neo-latina, ou neo-italiana.
Para a manutenção, estruturação e conservação desta língua, foi fundamental a participação da Fondazione Giovanni Agnelli. Ao nos dirigirmos ao Dr. Pacini com a proposta de se pesquisar o vocabulário e dicionário das palavras ítalo-gaúchas, ele simplesmente nos disse: «Potete farlo e dopo si vedrà cosa fare.» Recorremos, então, ao lingüísta descendente de poloneses, Frei Alberto Victor Stawinski, capuchinho, e lhe fizemos o convite para integrar o Grupo de Pesquisas apoiado pela Fondazione, e tivemos a ventura de publicar o primeiro dicionário da primeira língua italiana com caraterísticas próprias de língua autônoma que se formou fora da Itália nos contingentes imigratórios.
Dicionário vêneto-sul-rio-grandense Português,1987, é o título da obra pioneira, hoje publicada na Itália em edição trilíngue, pela Unione dei Triveneti nel Mondo, com tradução de Ulderico Bernardi e Aldo Toffoli (1995).
A Fondazione Giovanni Agnelli foi a primeira instituição italiana a dar atenção integral e permitir que nosso linguajar figurasse na galeria das pesquisas e publicações com sua roupagem cultural própria que é o Talian. Isto nos levou à formação de um grupo hoje numeroso de escritores do Talian e a publicações multiplicadas em Talian, com mais de duas centenas de títulos em todo o Rio Grande do Sul.
A delegação de responsabilidade, a valorização de nossa fala e expressões culturais pela Fondazione Giovanni Agnelli nos tornou autônomos, corajosos e seguros do futuro de nossa língua, hoje com mais de cem emissoras com programações semanais em Talian, nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Gioás e Rondônia.
Nossa identidade com base no Talian, nos faz os Italianos do Rio grande do Sul. E a Fondazione Giovanni Agnelli se tornou nossa mãe, porque nos adotou como filhos, permitindo-nos a liberdade cultural, seja colhendo nossa língua materna, seja promovendo os primeiros cursos de língua italiana.
Com o Talian salvamos nossa identidade histórica, com o Italiano caminhamos ao encontro de nossa pátria mãe unificada política e lingüisticamente no Italiano toscano.
Nestes 20° número de Altreitalie, podemos nos atestar a Outra Itália, com alma própria, originária, que é nossa língua e com a decisão e definição da manutenção de nossa experiência cultural italiana como um todo.
Dr. Marcello Pacini e família da Fondazione Giovanni Agnelli, nosso muito obrigado por nos ter ouvido, entendido e permitido caminhar junto e também com nossos próprios pés. Da diversidade fraternizada culturalmente somos hoje uma grande unidade italiana com os 25 milhões de ítalo brasileiros, simpáticos aos nossos 168 milhões de brasileiros.
A língua materna se pode perder uma só vez, e isto não nos aconteceu pelo cultivo de sua alma que é a língua.
Pacini e Fondazione Agnelli ve ringrassiemo parché gavì fato la vostra parte e, desso, noantri continuaremo a far la nostra par onor, gioia, ricordo dei nostri antenati, tanti in paradiso e altri ancora qua in meso a noatri che i ne vol ben, che i ride, i magna e i beve contenti, parché la nostra cultura no la mor pi.
Riferimenti bibliografici
Aa. Vv., Euroamericani. La popolazione di origine italiana negli Stati Uniti, La popolazione di origine italiana in Brasile, La popolazione di origine italiana in Argentina, Torino, Fondazione Giovanni Agnelli, 3 voll., 1987.
Luis A.De Boni e Rovílio Costa, Os Italianos do Rio Grande do Sul, Porto Alegre-Torino,EST- Fondazione Giovanni Agnelli 19721, 1984.
Alberto Vito Stawinski, Dicionário vêneto-sul-rio-grandense Português, Porto Alegre-Torino, EST-Fondazione Giovanni Agnelli, 1987.
Mário Gardelin e Rovílio Costa, Povoadores da Colônia Caxias, Porto Alegre-Torino, EST-Fondazione Giovanni Agnelli, 1992.
Rovílio Costa e outros, Colônias Italianas Conde d’Eu e Dona Isabel,Porto Alegre-Torino, EST-Fondazione Giovanni Agnelli, 1992.
Fidélis Dalcin Barbosa, Antônio Prado e sua história, Porto Alegre-Torino, Escola Superior de Teologia São Laurenço de Brindes-Fondazione Giovanni Agnelli, 1980.
Fidélis Dalcin Barbosa, São Vigilio. Da segunda Legua Cem Anos de Historia,Porto Alegre-Torino, EST-Fondazione Giovanni Agnelli, 1980.
Arquivo Historicode Rio Grande do Sul, Registro de imigrantes do Núcleo Colonial de Nova Palmira, aos cuidados de Rovílio Costa, Porto Alegre-Torino, EST-Fondazione Giovanni Agnelli, 1989.
Louis A. De Boni, A presença italiana no Brasil, 3 voll., Porto Alegre-Torino, EST-Fondazione Giovanni Agnelli, 1987, 1990 e 1996.
Rovilio Costa, Arlindo Battistel, Assim vivem os italianos,4 voll., Porto Alegre-Torino, EST EDUCS-Fondazione Giovanni Agnelli, 1982-1983.